quinta-feira, 11 de junho de 2009

O Russo!

Depois de terminar de ler o livro “Eisenstein” de Arlindo Machado, pude perceber o quão complexo foi esse russo. Primeiro que ele só foi quem ele foi pela Revolução de 1917, quando ele ainda era um garoto de 19 anos. Se nada disso tivesse acontecido, ele seria mais um burguês dentro da aristocracia russa, como seu pai e sua avó.
Vou relatar aqui os fatos que mais me chamaram a atenção e aqueles que eu lembro também – minha memória não anda muito boa. Eisenstein era um cara que ria na cara do perigo. Uma expressão idiota, porém verdadeira perante a maneira que ele lidava com as autoridades russas. Como Arlindo Machado diz, ora ele era endeusado, ora expurgado. Ele simplesmente fazia as coisas da maneira que achava certa, com o seu olhar. Foi um cineasta ousado, tanto em se tratando do conteúdo como da parte técnica. Stalin chegou a mandar um telegrama, enquanto Eisenstein rodava “Que Viva México!” dizendo: “Eisenstein aqui é considerado um desertor que rompeu com sua pátria. Ele perdeu a confiança de seus camaradas”. Tudo isso porque Hollywood estava dando certo apoio à produção. Eisenstein vivia para os seus filmes, e não para o andamento da política russa. Ele criava a sua própria visão política, e não aceitava pensamentos pré-concebidos e impostos pelas autoridades. “Ivan, o terrível”, é um exemplo disso. Ele foi produzido como tributo a Stálin, e Eisenstein seguiu a risca tudo o que Stálin fez. Mostrou o governante que unificou o país e o protegeu dos estrangeiros, mas não escondeu o terror que foi o seu regime.
Mas é importante frisar não só sua história, mas também a nova visão que ele deu ao cinema, que começou com o teatro. Primeiramente temos que citar o construtivismo. Nada de romantismo, emoção e expressão natural. O que Eisenstein propôs foi colocar um pouco mais de ciência e pedagogia nas encenações. Ele negava movimentações guiadas pelo instinto, tudo deveria ser simetricamente e rigorosamente pensado. O objetivo era alcançar a reação exata do público, fazer algo com a certeza de que as pessoas reagirão de certa maneira. O que interessava era a mecânica do corpo.
O projeto teatral de Eisenstein era divido em atrações. O que significa isso? Uma história não precisaria mais ser narrada, o que importava eram apenas os pontos centrais da trama: as atrações. Elas seriam a base de entendimento perfeito da história. Vale a pena colocar um trecho do livro de Arlindo Machado: “O teatro tornava-se fábrica: economia e concisão de uma linha de montagem, racionalização e eficiência de um cronograma de operações(...)”.
“A Greve” é uma obra de transição na vida do cineasta. Foi com ela que ele repensou essa idéia de atrações, e através disso surge a montagem. Não foi fácil não, foi um momento conturbado na carreira de Eisenstein. O que ele mudou dentro do cinema foi a maneira como o próprio cinema era apresentado: pronto para o público. Eisenstein passou a usar na montagem metáforas, mudanças cronológicas e espaciais que vinham embutidas de conceitos e significados. Só entendia o seu cinema quem não tivesse um “receptáculo vazio de ideologias alheias, mas é sujeito ativo (se não for, não entenderá nada) e por isso mesmo intelectualmente livre para aceitar ou rejeitar”, segundo Machado.
Eisenstein usou também o fator contradição de planos na hora da montagem. Ele não se satisfez em simplesmente unir um plano ao outro para criar um sentido e uma ordem cronológica. Eisenstein nunca se satisfez com o comum. Ele criava choques de valores opostos, montagem para ele era desencadeamento de conflitos. “O Encouraçado Potemkin” é um exemplo claro desse trabalho. Arlindo Machado dá alguns exemplos, como na seqüência dos barcos em direção ao Potemkin. São planos mostrando várias direções, sem nenhuma ordem, cruzando-se entre eles. Eisenstein não estava preocupado com a reconstituição, mas sim com a interpretação. A idéia de coletivo e individual é também proposta durante o tempo inteiro no filme – característica importante do Experimentalismo Soviético.
Para Eisenstein o que era mais importante dentro do cinema era deixar claro essa montagem, deixar com que a técnica apareça, o cinema é a produção do sentido. Para ele, a montagem que não se percebe é manipulação ideológica do cinema.
Outro diferencial do cineasta foi a maneira como ele tratou o erotismo nos filmes. Não explorou apenas a sexualidade carnal entre homem e mulher. “O erotismo para ele, era uma energia vital que percorria todas as formas vivas e todos os objetos animados pelo homem, razão pela qual não se podia esgotar no ato sexual propriamente dito, mas estaria se manifestando até mesmo fora de qualquer espécie de ato sexual”, afirma Machado.
Depois de tudo isso é certo dizer (e nem tudo está aqui) que Eisenstein decididamente quebrou barreiras dentro do cinema!

Por Fernanda Giotto Serpa

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